quinta-feira, dezembro 08, 2005

Passa a outro e não ao mesmo

No conclave papal após a morte de Bento XVI por cirrose contavam-se os boletins de voto da eleição do novo Papa.Um membro da Guarda Suíça Pontifícia preparava já um molhinho de lenha e acendalhas para o lume que iria dar o fumo branco ou negro, consoante o resultado da votação ser ou não conclusivoNuma mão tinha a milagrosa madeira húmida que daria o fumo branco e na outra, o sagrado pneu de borracha, para o caso de ser fumo negro.Remetido a um canto, o bispo António Felindo rezava para que não fosse o escolhido.Olhando em retrospectiva, tentava perceber como chegara ali, no centro dos olhares do mundo, colocado como favorito para vencer e ser eleito o novo Papa.Sabia que o seu país, Portugal, estava literalmente preso ao ecrã, em particular os seus detractores. Sabia que milhões de vozes rezavam para que fosse ele o escolhido pois era considerado o único sacerdote capaz de aproximar a igreja da juventude e do novo milénio, garantindo o sucesso da igreja Católica.António Felindo era extraordinariamente mediático e comunicativo. Todos queriam um bocado dele, desde as revistas cor de rosa, aos debates na televisão, a programas de humor. António Felindo era vestido pela Ana Salazar e era considerado um dos homens mais sexys de Portugal. Agora, com aquela projecção mediática a sua fama crescera por todo o planeta. Tratava por ‘tu’ as câmaras de Tv. e parecia quase extravagante nos seus trejeitos de homem sensível.Começara assim desde muito pequeno. O pai batia-lhe e dizia-se desiludido por ter um filho ‘maricas’ que se recusava a entrar nos jogos violentos dos amigos, preferindo a contemplação, brincar com bonecas ou às casinhas.O caso ficou tão grave que já na adolescência, o pai achou por bem pô-lo no seminário, a ver se uma boa educação moralmente forte e a ideia de pecado o endireitava. A sua esperança era que ele depois enveredasse pelo compromisso da Opus Dei e tivesse uma carreira de sucesso mais facilitada.Estranhamente ou não, António Felindo ficou deliciado com a ideia de enveredar pela carreira do sacerdócio, juntando-se a outros outros rapazes que também, por diversos motivos, se queriam afastar do mundo mundano, e assim decidiu não ir para a Opus Dei.Um dia Felindo estava de joelhos a rezar e sentiu o chamamento.Apaixonara-se por Jesus na cruz, o seu corpo bem torneado seminu, e toda aquela iconografia sadomasoquista que lhe provocava embaraçosos calores.A ideia de flagelação dava-lhe um prazer intenso, assim como a companhia dos acólitos bonitos como anjos. O imaginário gótico das igrejas parecia saído de um Eyes Wide Shut do Kubrick. Por Deus, até as roupas debruadas a ouro e a fantástica túnica lilás de bispo pareciam feitas no céu para ele!
Podia coscuvilhar no confessionário, algo que adorava. Sabia sempre as novidades mais picantes. As mulheres gostavam dele como um amigo, alguém capaz de as ouvir e de as aconselhar condignamente, sobre todo o tipo de questões como adultério até cremes de beleza. Faziam fila para se confessar a Felindo e os cabeleireiros da vila, que no início sentiam inveja, também começavam já a frequentar o confessionário.Depois de se confessarem ao Felindo, era Felindo quem saía do confessionário e se ia confessar a outro colega, ouvindo sempre aquela piada muito useira entre membros do clero: “passa a outro e não ao mesmo”.Felindo trouxe um look glam à sua paróquia, deixara crescer o bigode à Freddy Mercury e vestia uma túnica justa com uma cruz de brilhantes. Era uma super-estrela e os jovens adoravam-no. Na sua igreja, com a dona Aurora no órgão casio e coro de acólitos “Anjinhos Frescos” gravou um disco de versões cristãs de canções dos anos 80 e 90 que imediatamente se tornou num hit mundial, com hinos como “smells like holly spirit”, “welcome to the bible”, “i want to pray free”, “tainted dove”, “message in a bible” e “i just cant pray enough”.Depois dessa ascenção meteórica encontrou o equilíbrio, tornou-se mais calmo e discreto, dedicando-se a tentar levar a palavra de Deus a outras pessoas que se encontravam divorciadas da Igreja. Segundo Felindo, a Igreja tinha de assumir a sua fraqueza de condição de mortal, e procurar assim, humildemente, não se superiorizar moralmente a sectores da sociedade que a rejeitam apenas por preconceito.
Felindo trouxera mais gente à Igreja e à ideia de comunhão e partilha, de fazer bem ao outro.O Bispo António Felindo, sentiu-se subitamente elevado e pronto a aceitar o desafio. Pediu desculpa a Deus por ter duvidado dos seus intentos. Nesse momento a contagem terminou.António Felindo era agora o novo Papa. Escolheu o nome Toy George I.
Pelo meio dos abraços de felicitações dos colegas bispos, sentiu um apalpão que logo retribuiu, ao acaso, com a piada passateum ad un altrum et non allo stessium, ou "passa a outro e não ao mesmo", mas agora em latim, visto que era Papa e a tradição do Vaticano o exigia.

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